Uma das dificuldades naturais, e que gera não poucas dúvidas, é a que se somos "protestantes" ou "evangélicos", ou até mesmo se isso tem alguma importância. Diante de semelhanças e principalmente diferenças ( por não se desejar ser confundido ou alinhado com algum outro ) igrejas autodenominadas evangélicas se pronunciam publicamente, tomando decisões de não reconhecer outra igreja como genuinamente evangélica. Alguns optam por não se autodenominarem e nem serem chamados de evangélicos, preferem termos como "crentes", "reformados" e na maioria das situações atuais rejeita-se o termo "protestante". Pior do que errar é justificar erradamente o erro como se fosse uma acerto. Para dirrimir as dúvidas vai abaixo um pequeno texto sobre esse assunto.
O QUE É UM PROTESTANTE,
O QUE É SER PROTESTANTE?
O grande e maior princípio da Reforma é o da liberdade e está explícito no talvez menor dos livros de Martim Lutero (2) e mesmo de toda a literatura reformada. Diz Lutero que o cristão é “senhor livre sobre todas as coisas e não está sujeito a ninguém”, mas completa: “um cristão é um servo prestativo em todas as coisas e está sujeito a todos”. Essa aparente contradição se resolve assim: o cristão é livre para fazer e não fazer ou, ainda, o cristão não está debaixo de nenhuma mediação e se refere diretamente a Deus pela fé, instrumento de sua salvação. A salvação é individual e sua vida religiosa é pautada exclusivamente pela Bíblia cuja leitura é direta e também não mediada. Como pontifica Dunstan, o homem é o centro de sua religião.
Em suma, o protestante é o homem que se sente liberto por Cristo, segue exclusivamente a Bíblia “como única regra de fé e prática”, cultiva uma ética racional de desempenho para contribuir para a glória de Deus e vive moralmente segundo os “10 mandamentos” e os padrões da moral burguesa vitoriana. A conversão, que no período do Grande Despertamento (3) era mais propriamente uma “reconsagração” à vida devota, reajustava o indivíduo ao modelo burguês vitoriano acompanhado da ética do trabalho apropriada à ideologia do progresso. A preguiça, a ociosidade e a falta de objetividade na vida, assim como desregramentos sexuais e desorganização familiar, eram pecados graves para os vitorianos (4).
O protestantismo, principalmente o calvinismo posterior, privilegiou as relações sociais e econômico-políticas no sentido horizontal, buscando pôr de lado todo tipo de dependência piramidal ou vertical. Em suma, uma desconfiança permanente de monarquias absolutas em favor de repúblicas democráticas. Isso ganhou muita força após a independência das colônias norte-americanas e da expansão protestante durante o século XIX (5).
Referências:
1 Como nos chama a atenção esse autor, não confundir com os evangélicos de vertente inglesa mais moderna que designam a ala conservadora do protestantismo contemporâneo e que estão sendo identificados atualmente pelo neologismo "evangelical"
2 Da Liberdade Cristã, escrito em 1520 (Lutero, 2004). Ver também: Altmann, 1994.
3 Grande Despertamento ou Grandes Avivamentos designam movimentos esparsos de renascimento de vitalidade religiosa que ocorreram na América do Norte a partir dos primeiros anos do século XIX.
4 Quanto a isso é muito interessante ver: Gay, 2000 e 2005.
5 Bastaria, neste ponto, assinalar o testemunho da missionária educadora metodista Martha Watts (1881-1908), fundadora do Colégio Piracicabano, em carta de abril de 1890, logo após a proclamação da República: “O Brasil está indo para frente, e devemos seguir com ele, carregando a religião do Evangelho […]” (Mesquita, 2001, p. 90).
Fonte: ANTONIO GOUVÊA MENDONÇA O protestantismo no Brasil e suas encruzilhadas pp 4 e 5
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